quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

De quem é o governo?



A resposta para a pergunta do título é simples, não é? O governo é meu. É seu. É nosso. O governo é pago com a minha grana, e com a sua grana. A presidenta, o governador, o prefeito, os trocentos deputados, os vereadores, o segundo escalão, e o terceiro, e o quarto… São todos nossos funcionários. Eles trabalham para nós. O papel deles é cuidar dos nossos interesses – do interesse público. Óbvio.
Este prédio é meu. Foto: Thiago Melo – CC
Só que não.
O governo claramente não trabalha para mim. Pegue por exemplo o da minha cidade, São Paulo, que até outro dia era exercido pelo Gilberto Kassab. Kassab trabalhou duro ao longo dos últimos quatro anos. Acordava cedo, ia dormir tarde, fazia mil reuniões, estava sempre na imprensa. Mas o chefe dele não era eu, era outro.
Durante boa parte do mandato, o grosso do trabalho do Kassab não era para mim. Muito do seu tempo foi gasto articulando para criar um novo partido. O prefeito passava os dias falando com políticos Brasil afora, convencendo-os a ingressar em sua sigla. Ou se reunindo com lideranças do governo federal e dos estaduais, prometendo apoio, negociando cargos.
E, certamente, muito do seu trabalho foi reunir o apoio dos setores econômicos, para assegurar que seu partido receberia gordos financiamentos de campanha. E por que os setores econômicos dão dinheiro para candidatos e para partidos políticos? Simples: por que esperam receber algo em troca. É, mais do que tudo, para esse pessoal que o prefeito trabalhou: para os financiadores de campanha.
Do ponto de vista da população, Kassab foi muito mal sucedido em seu governo. Ele terminou o mandato com aprovação de apenas 24% da população, uma das piores do Brasil. Em 2012, diversos movimentos de moradores de São Paulo juntaram-se para homenageá-lo com o prêmio de “pior prefeito da história da cidade”.
Mas nada disso o afetou muito. Afinal, o patrão de Kassab não era a população, eram os empresários que financiaram sua campanha. E esses terminaram o mandato satisfeitíssimos. Tanto que seu novo partido recebeu fartas doações e, como estava cheio da grana, elegeu centenas de prefeitos, a quarta maior bancada da Câmara e até alguns governadores.
Kassab não é uma exceção: ele é só o ponto extremo de um fenômeno que abrange praticamente todos os políticos bem sucedidos do Brasil, do PT ao PSDB aos mil nanicos, do presidente aos vereadores. Todo mundo recebe a maior parte do dinheiro de suas campanhas de empresas que vivem de contratos com o governo: construtoras, incorporadoras, empreiteiras etc. Todos gastam grande parte do seu tempo suando para agradar esses financiadores. Todos, ao tratar os financiadores de campanha como patrões, negligenciam seus verdadeiros patrões: você e eu.
Esses dias, li um livro chamado Republic, Lost, escrito por um autor de quem sou fã faz tempo: o jurista Lawrence Lessig, de Harvard, o mesmo cara que liderou o movimento Creative Commons, por um novo modelo de direitos autorais. Achei o livro revelador. Lessig mostra que esse problema não é exclusividade do Brasil. Longe disso, aliás: os Estados Unidos também, assim como boa parte dos países do mundo, sofrem com uma “corrupção” do sistema político. “Os congressistas americanos passam até 70% do seu tempo arrecadando dinheiro para suas campanhas”, diz Lessig.
E qual a solução para isso? “Reforma política”, dirão alguns. Sim, claro, mas não essa reforma política sobre a qual os deputados ficam falando – não são as raposas as mais bem indicadas para planejar o novo sistema de acesso ao galinheiro. Não será o Congresso que vai mudar o sistema pelo qual o Congresso foi eleito. Cabe a nós – eu e você – imaginar jeitos de fazer nossos funcionários trabalharem para nós. Falaremos mais disso por aqui no futuro.
Acima, um vídeo no qual Lawrence Lessig expõe a tese
de seu livro e propõe uma solução para o problema.
Está em inglês, mas não é difícil de entender… 

Via:Superinteressante.

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